segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Empresa que rasurou CTPS do trabalhador é condenada a pagar dano moral - Leia a íntegra da decisão

Dando razão a um trabalhador, que teve a sua carteira de trabalho rasurada pela reclamada, a 5a Turma do TRT-MG condenou a empresa ao pagamento de indenização por danos morais. No entender dos julgadores, o desleixo da reclamada, ao lidar com um documento tão importante, causou lesão moral ao trabalhador, que precisará sempre explicar as razões da rasura.

Segundo explicou o desembargador José Murilo de Morais, consta na cópia da CTPS do reclamante o registro do contrato de trabalho, com admissão em 22.09.09, rasurado pela sobreposição de um carimbo com a palavra “cancelado”. A reclamada justificou a rasura no fato de o trabalhador, sem qualquer motivo, não ter se submetido ao exame médico admissional, agendado para o dia 21.09.09, o que levou a empresa a entender que ele teria desistido do emprego. Por essa razão, apenas cancelou a anotação da CTPS, que já havia sido realizada antecipadamente.

No entanto, o relator constatou que a justificativa da reclamada não reflete a realidade. Isso porque a preposta declarou, em audiência, que a CTPS dos candidatos a emprego somente é assinada após a aprovação nos exames e conferência de toda a documentação necessária. O que ficou claro, para o magistrado, é que a empresa não tomou o devido cuidado ao manusear documento tão importante do trabalhador. Primeiro, porque anotou o contrato, antes do término do processo de admissão. Segundo, porque a desistência da contratação deveria ter sido registrada na parte da CTPS destinada a anotações gerais, de modo a amenizar os possíveis constrangimentos.

“Em razão do desleixo, toda vez que a CTPS for apresentada perante um potencial empregador, ou em qualquer outra ocasião, o reclamante necessitará explicar os motivos da rasura, isso se tiver oportunidade, fatos que geram sim constrangimentos e caracterizam lesão moral indenizável, a teor do art. 186 CCB” - enfatizou o desembargador, condenando a empresa ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$2.500,00, aproximadamente, cinco vezes o salário combinado.

( RO nº 01577-2009-087-03-00-1 )

TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO

Acórdão

Processo : 01577-2009-087-03-00-1 RO
Data de Publicação : 13/08/2010
Órgão Julgador : Quinta Turma
Juiz Relator : Des. Jose Murilo de Morais
Juiz Revisor : Juiz Convocado Jesse Claudio Franco de Alencar

RECORRENTES: SYNCREON LOGÍSTICA S.A. E JOSIAS BARBOSA DA SILVA

RECORRIDOS: OS MESMOS

EMENTA: INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CARACTERIZAÇÃO. O direito à indenização proveniente de danos morais requer a presença de pressupostos específicos para ser reconhecido: ato ilícito, nexo de causalidade, culpa omissiva ou comissiva, e implemento do dano para ensejar a reparação, pressupondo a lesão dor física ou moral pela ofensa a bem jurídico inerente aos direitos de personalidade, como ao nome, capacidade, honra, reputação, liberdade individual, tranquilidade de espírito, imagem, integridade física e tudo aquilo que seja a expressão imaterial do sujeito.

RELATÓRIO

O juiz Pedro Paulo Ferreira, da 4ª Vara de Betim, julgou parcialmente procedente a reclamatória.

Recorrem as partes.

A reclamada, contra o reconhecimento do vínculo empregatício e a condenação ao pagamento de verbas rescisórias, multa do art. 477 da CLT e contra o deferimento da gratuidade judiciária.

O reclamante, insistindo o pedido de indenização por danos morais.

Contrarrazões recíprocas às fls. 160/168 e 170/173.

As guias de custas e depósito recursal encontram-se às fls. 158/159.

VOTO

Conheço dos recursos porque próprios, tempestivos e regularmente preparado o patronal.

1. Recurso da reclamada

1.1. Relação de emprego. Verbas rescisórias

O reclamante afirmou que após passar pelas etapas pertinentes ao processo de seleção para uma vaga de operador de logística na reclamada, no dia 21.9.09 entregou todos os documentos solicitados, entre eles a CTPS, oportunidade em que foi informado de que o contrato seria formalizado, devendo aguardar o chamado para o início dos trabalhos; que recebeu um telefonema solicitando o comparecimento no dia 29.9.09, quando, então, sem maiores explicações, foi dispensado, sendo a CTPS devolvida com registro de admissão no dia 22.9.09 e sobreposto um carimbo com o termo "cancelado".

Na contestação a reclamada sustentou que embora o reclamante tivesse sido aprovado nas etapas preliminares do processo de seleção, sem qualquer justificativa, deixou de se submeter ao exame médico admissional agendado para o dia 21.9.09, razão pela qual entendeu que ele havia desistido de ocupar a vaga disponibilizada; como já havia anotado o contrato de trabalho na CTPS, apenas cancelou referida anotação, assegurando não ter o contrato se concretizado.

Baseando-se no depoimento da preposta de que somente há assinatura da CTPS após a aprovação nos exames e conferência de toda a documentação, o juízo sentenciante reconheceu o vínculo empregatício de 22.9.09 a 30.9.09, condenando a reclamada a proceder à retificação da CTPS e ao pagamento de verbas rescisórias pertinentes descritas à fl. 86.

Entretanto, vê-se da própria narrativa das partes, que apesar de ter havido registro na CTPS, o reclamante não chegou a prestar serviços à reclamada, bem como não ficou à sua disposição, aguardando ou executando ordens, na forma do art. 4º da CLT.

Nesse passo, não é possível falar em liame empregatício, porquanto incontroversa a inexistência da prestação de serviço, prevista no art. 3º da CLT, e, via de consequência, em ruptura contratual e pagamento de verbas decorrentes.

Provejo.

1.2. Gratuidade judiciária

Constando dos autos declaração de miserabilidade assinada pela reclamante (fl. 20), é o quanto basta para que faça jus à tutela em questão, consoante os §§ 1º e 3º do art. 790 da CLT e art. 14 da Lei 5.584/70.

Desprovejo.

2. Recurso do reclamante

O direito à indenização pleiteada requer a presença de pressupostos específicos para ser reconhecido: ato ilícito, nexo de causalidade, culpa omissiva ou comissiva e implemento do dano, pressupondo a lesão dor física ou moral pela ofensa a bem jurídico inerente aos direitos de personalidade, como ao nome, capacidade, honra, reputação, liberdade individual, tranqüilidade de espírito, imagem, integridade física e tudo aquilo que seja a expressão imaterial do sujeito.

Na cópia da CTPS, colacionada à fl. 12, consta registro de contrato de trabalho com admissão em 22.9.09, rasurado pela sobreposição de um carimbo com o termo "cancelado".

Como visto no item anterior, a reclamada alegou que sem qualquer justificativa o reclamante não se submeteu ao exame médico admissional agendado para o dia 21.9.09, levando-a a entender que teria desistido de ocupar a vaga de emprego, e como havia se antecipado à conclusão do processo seletivo e anotado a CTPS, apenas cancelou a anotação.

Entretanto, durante a instrução do feito a preposta asseverou que a "CTPS dos candidatos à admissão só é assinada após a aprovação nos exames e conferência de toda a documentação necessária" (fl. 79).

O contexto dos autos revela que a reclamada não adotou a necessária prudência no manejo de tão importante documento do empregado, primeiro, porque anotou o contrato sem que tivesse se aperfeiçoado; segundo, porque a desistência da contratação deveria ter sido consignada na parte da CTPS destinada a anotações gerais, de modo a minimizar eventuais constrangimentos ao reclamante.

Em razão do desleixo, toda vez que a CTPS for apresentada perante um potencial empregador, ou em qualquer outra ocasião, o reclamante necessitará explicar os motivos da rasura, isso se tiver oportunidade, fatos que geram sim constrangimentos e caracterizam lesão moral indenizável, a teor do art. 186 CCB.

Comprovada a conduta antijurídica e reconhecido o dano dela decorrente, o valor a ser atribuído à indenização fica ao arbítrio do juiz, que, no entanto, deve observar uma quantia justa, reparando condignamente o lesado, sem onerar em demasia a parte que deve arcar com o pagamento.

Isto considerado, arbitro à indenização o valor de R$2.500,00, próximo a cinco vezes o salário ajustado (R$2,33 por hora), montante que entendo compatível com a lesão cometida.

Provejo parcialmente.

ISTO POSTO

Conheço dos recursos e dou-lhes parcial provimento. Ao da reclamada, para afastar o vínculo empregatício reconhecido em primeiro grau, absolvendo-a da condenação pertinente. Ao do reclamante, para condenar a reclamada ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$2.500,00, sobre o que pagará custas complementares de R$20,00.

FUNDAMENTOS pelos quais,

O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em sessão ordinária da Quinta Turma, julgou o presente processo e, à unanimidade, conheceu dos recursos e, no mérito, deu-lhes parcial provimento. Ao da reclamada, para afastar o vínculo empregatício reconhecido em primeiro grau, absolvendo-a da condenação pertinente. Ao do reclamante, para condenar a reclamada ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$2.500,00, sobre o que pagará custas complementares de R$20,00.

Belo Horizonte, 3 de agosto de 2010.

Fonte: Revista Jurídica Netlegis, 27 de Agosto de 2010

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