terça-feira, 24 de agosto de 2010

Que se ouçam os Constitucionalistas (Clemilce Carvalho)

Mal ocorreu a sanção do reajuste para os aposentados e pensionistas em 7,72% (ano de 2010), elevação irrisória acima dos 6,14% propostos pela equipe econômica para os que têm benefícios superiores ao salário mínimo, e já recomeça a cantilena de que “o governo não tem caixa” para bancar a elevação do mínimo em 2011, conforme os primeiros estudos sugerem.

Volta à baila aquela posição cansativa, que vem sendo combatida e demonstrada como inverídica, à luz dos dispositivos constitucionais: a Previdência Social – ampliando, a Seguridade Social – não apresenta o rombo, o déficit, a insuficiência financeira ou o que mais queiram, se consultados os estudiosos que têm como base de suas convicções a Constituição Federal. A Carta Magna arrola, em seu artigo 195, o elenco de receitas que os parlamentares constituintes destinaram para atender a todos os programas da Seguridade Social, sem destinação específica, de qualquer delas, para cobrir este ou aquele custeio. Todas concorrem para atender ao sistema, em sua integralidade.

Não obstante a clareza deste dispositivo, temos assistido a pronunciamentos de pessoas, pouco qualificadas para discutir sequer os princípios elementares da previdência pública, arvorando-se em especialistas na matéria e insistindo no tal rombo, espalhando o terror e a insegurança no seio dos trabalhadores. Podemos indicar algumas dessas apresentações porque foram públicas.

O senhor Marcelo Caetano, economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), como se anunciou, assume, lamentavelmente, a defesa da existência do rombo. Ainda bem que esta não é a posição de todo o órgão. Aliás, temos estado em Seminários, Congressos e outros eventos, ouvindo a palavra oficial do IPEA, vinda de seu presidente, o competente economista Márcio Porchman, que é diametralmente oposta à de Marcelo Caetano.

Outra aparição conflitante com a realidade pôde ser acompanhada em programa da Globonews, quando era discutido o reajuste de 7,72% dos aposentados, buscando conhecer o seu “impacto no déficit da Previdência”. Contra a posição segura e técnica do economista Eduardo Fagnani, professor da UNICAMP, que contestava a existência de déficit, aparecia, numa “janela”, a figura pitoresca do senhor Fábio Giambiagi, numa fala tão desafiadora quanto deselegante, retrucando as colocações corretas do professor Fagnani. Desoladora a maneira pouco ética do participante que, sem recursos para o debate, partiu para a ironia descabida.

Não sei a quem servem esses senhores que falam do “financiamento do governo” para cobrir as contas da Previdência Social. Nada sabem, coitados! “Cobrem” com o que o governo não tem?

Parece não ser de seu conhecimento – repetimos mais uma vez – que o Orçamento Fiscal, o do governo, de impostos e taxas, é que não se sustenta há muitos anos, e se vale das receitas da Seguridade Social para fechar suas contas. Falsos “especialistas em finanças públicas”, também reincidentes nesses erros, não comentam a verdade do rombo do governo: sempre crescente, gerado pelos juros que sustentam a dívida pública, e que aumentou em mais de R$ 22 bilhões, somente com a elevação dos juros em 1,5 ponto percentual nas duas últimas decisões do COPOM, o Comitê de Política Monetária do Banco Central.

A equipe técnica do Ministério do Planejamento, a área econômica do governo e os consultores especializados precisam vir a público corrigir seu discurso quanto aos resultados da Seguridade Social. Se não contam com especialistas capazes de interpretar, com legitimidade, o que pretenderam os Constituintes de 1988, que se ouçam esses senhores e se mostre, de uma vez por todas, a verdade.

É ilegítimo levantar o “déficit” da Previdência Social, usando para compor a conta uma única receita e, contra ela, todos os benefícios. Pobres ‘especialistas’ estes que, de fato, nada sabem. E, se sabem, que declarem suas intenções!

De há muito a Seguridade Social vem bancando todos os programas sociais e as insuficiências do orçamento do governo, concorrendo com o desvio de suas receitas através da DRU (Desvinculação de Recursos da União), e com o que ainda sobra das operações indevidas.

Um viés da história que talvez não convenha contar.

Fonte: Anfip

Nenhum comentário: